Páginas

Total de visualizações de página

sábado, 26 de maio de 2012

O Mito de Narciso em: Oscar Wilde e Machado de Assis

"E sem dúvida o nosso tempo...prefere a imagem à coisa, a cópia ao original, a representação à realidade, a aparência ao ser... "(Feuerbach)

O objetivo deste ensaio é aproximar a obra do escritor irlandês de língua inglesa Oscar Wilde com a obra do escritor brasileiro Machado de Assis.
Para este feito iremos comparar o romance: "O Retrato de Dorian Gray" (Oscar Wilde); com o conto "O Espelho" (Machado de Assis). E nosso foco vai de encontro onde as duas obras de confrontam: "O Narcisismo" embutido em ambos os personagens centrais: Dorian Gray e Jacobina.

 Oscar Wilde (1854-1900) É uns dos grandes escritores da íngua inglesa, escreveu várias obras importantes da literatura universal. Com suas atitudes iconoclastas e anti-convencionais escandalizou o mundo literário de sua época. Oscar Wilde imaginou levar a vida como se fosse uma obra de arte. Para ele só a beleza contava.  Nascido em Dublin, na Irlanda, em uma família meio inglesa e meio irlandesa, Wilde foi, com sua estética e sua vida elegante, um dos mais aclamados autores teatrais e uma celebridade no fim do período vitoriano, na Inglaterra do século 19. Wilde levou uma vida de celebridade no velho continente, porém morreu amargurado no exílio na França. Mas esta parte de sua história não nos interessa neste momento, pois sua arte transpassa a linha do tempo, e ainda hoje nos provoca!


Machado de Assis (1839-1908) Na verdade Joaquim Maria Machado de Assis. Filho de Francisco José de Assis, um mulato pintor de paredes, e de Maria Leopoldina Machado, uma lavandeira açoriana, Machado de Assis passou a infância na chácara da família Barroso, no bairro do Livramento. Aos quinze anos de idade, Machado já transitava do subúrbio até a cidade, publicada alguns versos na Marmota Fluminense e frequentava a Sociedade Petalógica. Trabalha como jornalista e, a partir de 1860, inglesa no funcionamento público. Em 1869, casou-se com Carolina Augusta Xavier, portuguesa. Nomeado diretor do Diário Oficial, não viu diminuídas suas dificuldades financeiras, tanto que continuou a colaborar na imprensa. Paralelamente a sua carreira publica, tornou-se um escritor admirado e respeitado, ajudando a fundar, em 1896, a Academia Brasileira de Letras, da qual foi eleito primeiro e perpétuo presidente. Das muitas contribuição de Machado de Assis, a mais importante sem dúvida é a de colocar a nossa literatura no mapa mundial literário. Não estamos desmerecendo os outros escritores do nosso país, porém assim como há uma música antes de Bach e outra depois de Bach, na literatura brasileira acontece algo semelhante. Machado de Assis é o maior escritor brasileiro de todos os tempos, e suas obras até hoje perdura em nossa existência. Seus temas vem do cotidiano. É do dia a dia da rua, do passeio público, que as coisas vem surgindo. Sua linguagem atribui reúne elaboração e simplicidade, além de colocar o leito incluso nas suas obras. E claro, não podia faltar a sua ironia. Com tantas qualidades, sem dúvida Machado de Assis é um dos grandes cânones da literatura Mundial. 

Para dar continuidade em nosso ensaio, daremos uma pequena apresentação do tema "Narcisismo". Lógico que não podemos abrir mão do mito de Narciso.

O Mito de Narciso
Narciso era filho do deus-rio Cephisus e da ninfa Liriope, e era um jovem de extrema beleza. Porém, à despeito da cobiça que despertava nas ninfas e donzelas, Narciso preferia viver só, pois não havia encontrado ninguém que julgasse merecedora do seu amor. E foi justamente este desprezo que devotava às jovens a sua perdição. Pois havia uma bela ninfa, Eco, amante dos bosques e dos montes, companheira favorita de Diana em suas caçadas. Mas Eco tinha um grande defeito: falava demais, e tinha o costume de dar sempre a última palavra em qualquer conversa da qual participava. Um dia Hera, desconfiada - com razão - que seu marido estava divertindo-se com as ninfas, saiu em sua procura. Eco usou sua conversa para entreter a deusa enquanto suas amigas ninfas se escondiam. Hera, percebendo a artimanha da ninfa, condenou-a a não mais poder falar uma só palavra por sua iniciativa, a não ser responder quando interpelada.


Assim a ninfa passeava por um bosque quando viu Narciso que perseguia a caça pela montanha. Como era belo o jovem, e como era forte a paixão que a assaltou! Seguiu-lhe os passos e quis dirigir-lhe a palavra, falar o quanto ela o queria... Mas não era possível - era preciso esperar que ele falasse primeiro para então responder-lhe. Distraída pelos seus pensamentos, não percebeu que o jovem dela se aproximara. Tentou se esconder rapidamente, mas Narciso ouviu o barulho e caminhou em sua direção:
- Há alguém aqui?
- Aqui! - respondeu Eco.
Narciso olhou em volta e não viu ninguém. Queria saber quem estava se escondendo dele, e quem era a dona daquela voz tão bonita.
- Vem - gritou.
- Vem! - respondeu Eco.
- Por que foges de mim?
- Por que foges de mim?
- Eu não fujo! Vem, vamos nos juntar!
- Juntar! - a donzela não podia conter sua felicidade ao correr em direção do amado que fizera tal convite.
Narciso, vendo a ninfa que corria em sua direção, gritou:
- Afasta-te! Prefiro morrer do que te deixar me possuir!
- Me possuir... - disse Eco.
Foi terrível o que se passou. Narciso fugiu, e a ninfa, envergonhada, correu para se esconder no recesso dos bosques. Daquele dia em diante, passou a viver nas cavernas e entre os rochedos das montanhas. Evitava o contato com os outros seres, e não se alimentava mais. Com o pesar, seu corpo foi definhando, até que suas carnes desapareceram completamente. Seus ossos se transformaram em rocha. Nada restou além da sua voz. Eco, porém, continua a responder a todos que a chamem, e conserva seu costume de dizer sempre a última palavra. Não foi em vão o sofrimento da ninfa, pois do alto, do Olimpo, Nêmesis vira tudo o que se passou. Como punição, condenou Narciso a um triste fim, que não demorou muito a ocorrer.
Havia, não muito longe dali, uma fonte clara, de águas como prata. Os pastores não levavam para lá seu rebanho, nem cabras ou qualquer outro animal a frequentava. Não era tampouco enfeada por folhas ou por galhos caídos de árvores. Era linda, cercada de uma relva viçosa, e abrigada do sol por rochedos que a cercavam. Ali chegou um dia Narciso, fatigado da caça, e sentindo muito calor e muita sede.


Narciso debruçou sobre a fonte para banhar-se e viu, surpreso, uma bela figura que o olhava de dentro da fonte. "Com certeza é algum espírito das águas que habita esta fonte. E como é belo!", disse, admirando os olhos brilhantes, os cabelos anelados como os de Apolo, o rosto oval e o pescoço de marfim do ser. Apaixonou-se pelo aspecto saudável e pela beleza daquele ser que, de dentro da fonte, retribuía o seu olhar.
Não podia mais se conter. Baixou o rosto para beijar o ser, e enfiou os braços na fonte para abraça-lo. Porém, ao contato de seus braços com a água da fonte, o ser sumiu para voltar depois de alguns instantes, tão belo quanto antes.


- Porque me desprezas, bela criatura? E por que foges ao meu contato? Meu rosto não deve causar-te repulsa, pois as ninfas me amam, e tu mesmo não me olhas com indiferença. Quando sorrio, também tu sorris, e responde com acenos aos meus acenos. Mas quando estendo os braços, fazes o mesmo para então sumires ao meu contato.


Suas lágrimas caíram na água, turvando a imagem. E, ao vê-la partir, Narciso exclamou:


- Fica, peço-te, fica! Se não posso tocar-te, deixe-me pelo menos admirar-te.
Assim Narciso ficou por dias a admirar sua própria imagem na fonte, esquecido de alimento e de água, seu corpo definhando. As cores e o vigor deixaram seu corpo, e quando ele gritava "Ai, ai", Eco respondia com as mesmas palavras. Assim o jovem morreu.
As ninfas choraram seu triste destino. Prepararam uma pira funerária e teriam cremado seu corpo se o tivessem encontrado. No lugar onde faleceu, entretanto, as ninfas encontraram apenas uma flor roxa, rodeada de folhas brancas. E, em memória do jovem Narciso, aquela flor passou a ser conhecida pelo seu nome.

E este fascínio pela imagem é visto no conto de Machado de Assis o "O Espelho":
A história de Jacobina (protagonista do conto) é curiosa: depois de ser nomeado alferes, a tia pede que ele a visite em sua fazenda e que não esqueça de levar a sua farda. Lá, todos os dias, Jacobina, veste a farda e se observa em um espelho antigo: " era a melhor peça da casa" . Em seguida a tia precisa se ausentar da propriedade . Os escravos aproveitam e fogem. Então, o alferes se vê sozinho. Fica nervoso, acabrunhado, como mal. Logo em seguida olha-se no espelho sem a farda e se assusta: enxerga uma figura "vaga, esfumada, difusa, sombra de sombra". É a alma exterior, que para Jacobina se resume em uma farda de alferes. Privado dela, o protagonista não vive mais. Precisa dela. Precisa desta imagem para se encontrar no mundo. Segundo o crítico Antonio Candido, a força do conto "vem da utilização admirável da farda simbólica e do espelho monumental no deserto da fazenda abandonada, construindo uma espécie de alegoria moderna das divisões da personalidade e da relatividade do ser"...
-"O alferes eliminou o homem. Durante alguns dias as duas naturezas equilibraram-se; mas não tardou que a primitiva cedesse à outra; ficou-me uma parte mínima de humanidade"


Na Obra "O Retrato de Dorian Gray, considerada a obra mais intrigante de Wilde,  tem como ponto de partida a relação entre o jovem Dorian e seu retrato, feito pelo pintor Basil. Certo dia, Dorian expressa a vontade de não envelhecer, como seu duplo no quadro. A partir de então, quem envelhece é o retrato, o que não torna mais simples a vida do jovem, que passa a desenvolver relações violentas tanto com as pessoas que o cercam quanto com o próprio retrato. Todos os seus crimes são expostos no seu retrato.
Quando o personagem Lord Henry afirma a Dorian que  "o tempo tem-lhe inveja e faz guerra aos seus lírios e suas rosas". Em Dorian abre-se a mais dolorosa ferida do ser humano: a efemeridade de sua existência. Lord Henry é o personagem que trás a inquietação em Dorian.
Vocês devem está perguntando onde o Narcisismo entra na história.
Dorian Era um jovem como afirma Basil: "a bela aparência de Dorian Gray: são dons dos deuses" (pag.17)
Depois do retrato pintado, Dorian Olhou-o e:
"A noção de sua beleza dominava-o como uma revelação" (pag.35)

E assim como Narciso, Dorian encanta-se e se apaixona-se pela própria imagem, e em função da mesma passa a viver
Deseja viver para sempre com aquele rosto juvenil:

"-Que tristeza!- murmurou Dorian.- Que tristeza!- repetiu, com os olhos cravados na sua efígie- Eu vou ficar velho, feio, horrível. Mas este retrato se conservará eternamente jovem. Nele, nunca serei mais idoso do que neste dia de junho... Se fosse o contrário! Se eu pudesse ser sempre moço, se o quadro envelhecesse!... Por isso, por esse milagre eu daria tudo!Sim, não há no mundo o que eu não estivesse pronto a dar em troca. Daria até a alma!" (pag. 36)

E é o que acontece. Depois disso Dorian vive uma vida de libertinagem, cometendo todos os pecados. E:

"Estava cada vez mais enamorado da sua própria beleza, mais e mais empenhado em corromper a sua própria alma" (pag.123)

Dorian, pouco a pouco foi transformando. Foi perdendo a sua essência bela. Como nas palavras de Basil:

"-Que horror, Dorian! Alguma coisa o transformou completamente. Por fora, voce Ainda é o belo rapaz que, não faz muito, ia ao meu estúdio e posava diariamente para o seu retrato: um rapaz simples, afetuoso, sem afetação. A criatura mais inocente deste mundo. Agora, não sei o que lhe sucedeu. Fala como se não tivesse coração, como se desconhecesse a piedade. " (pag.107)


Não contaremos o final da história, para o interessados fica aqui uma dica de ótima leitura. Um livro imperdível!
Narciso, Dorian e Jacobina carregam em si uma atitude que praticamente todos os humanos possuem.  A preocupação pela imagem. Uns até transformam essa preocupação em um orgulho. Vivem apenas pela imagem. O que importa é a aparência. A alma fica por segundo plano. 
E realmente ainda vivemos na "Sociedade do Espetáculo" que um dia foi descrita pelo filósofo francês Guy Debord, onde este critica essa sociedade mediada por imagens;


"o espetáculo é a afirmação da aparência e a afirmação de toda a vida humana -isto é, social- como simples aparência" (pag.16) e:

"Quando o mundo real se transforma em simples imagens, as simples imagens tornam-se seres reais e motivações eficientes de um comportamento hipnótico" (pag.18)


E para finalizar nada mais intrigante do que a afirmação de Oscar Wilde no Prefácio da obra:


"...A alma é uma realidade terrível. Pode ser comprada,
vendida, barganhada, intoxicada ou aperfeiçoada.
Há uma alma em cada um de nós. Eu sei"






sábado, 19 de maio de 2012

Gustave Flaubert & Eça de Queirós: A realidade despida

O objetivo deste ensaio é aproximar a obra do escritor francês Gustave Flaubert com a obra do escritor português Eça de Queirós. Ambos representante do Realismo. Para tal artimanha e provocação selecionamos a obra "Madame Bovary" (Gustave Flaubert); e o "O Crime do Padre Amaro" (Eça de Queirós). Ambas as obras do Realismo. Porém nosso enfoque será nas protagonistas de cada romance: "Emma Bovary"; e "Amélia"
A segunda metade do século XIX é a época dourada do romance, associado ao triunfo social da burguesia. Em toda Europa os escritores descrevem com espírito crítico e realista a nova sociedade. O romance demonstra ser o gênero adequado para retratar a sociedade capitalista movida pelo poder e pelo dinheiro. Seus traços facilitam uma perspectiva ampla da psique humana.


Gustave Flaubert (1821-1880) Principal representante do Realismo, com estilo minucioso unido a qualidade da prosa e a precisão das descrições  à complexidade dos argumentos, são algumas das grandes qualidades deste escritor. Trabalhava com grande desenvolvimento seus personagens, daí o caráter psicológico dos mesmos. "um mergulho na alma humana".












José Maria Eça de Queirós (1845- 1900)- É considerado o mais importante nome do Realismo português.
O Realismo se manifesta em sua obra na questão da crítica a sociedade e seus costumes. Eça soube flagrar vários aspectos da sociedade lisboeta. Para isso utilizou a ironia sutil e os recursos descritivos.
Sua produção literária pode ser dividida em três fases, mas é na segunda fase que sua obra se encaixa melhor a ideologia da época. Nesta e´poca aflora um Eça maduro, com uma escrita massacrante denunciando escândalos desta sociedade burguesa. 


O Crime do Padre Amaro
Considerado um romance de tese onde o autor discute ideias e defende algumas proposições.
No romance, o maior questionamento é sobre o celibato clerical, e com isso, o autor critica a sociedade ao "todo", porque ele vai fundo questionando a fé, mostrando que a hipocrisia e a falsidade tem um poder muito forte e desvirtuoso. A partir do envolvimento entre Amaro e Amélia, Eça compõe o quadro social da vida provinciana, caracterizando a hipocrisia religiosa dos personagens e o ambiente medíocre da pequena cidade. Desse envolvimento, Amélia caba engravidando. Para não levantar suspeitas, Amaro leva Amélia para fora da cidade, quando a criança nasce, levam-a para uma "tecedeira de anjo", assim são chamadas, porque davam fim aos recém nascidos. Amélia morre depois de dar a luz a criança, logo em seguida a criança também morre. O padre Amaro, vive normalmente como se nada tivesse ocorrido, sempre ocultando seu pecado. 
Com esse enredo Eça desmonta o padrão religioso da época.






Garanto que todos estão pensando: onde há uma comparação entre Amélia e Emma? Pois Emma é uma mulher além do seu tempo. Rompe os padrões....
Pois vamos lá!!!!




Madame Bovary
Uma espécie de homenagem a Dom Quixote pela relação obsessiva da protagonista com os livros. E ao mesmo tempo uma crítica ao romantismo. Retrata sem piedade um caso de excesso de idealismo; Emma é esposa de um médico do campo, homem bom, mas comum. Ela alimenta sua fantasia com leituras de romances sentimentalistas que levam a uma série de infidelidades. No final, oprimida por suas dúvidas, Emma acaba se suicidando.
Entre seus tantos méritos o romance se destaca pela perfeição formal e estilística, pelo excelente retrato psicológico da personalidade feminina e pela forma desapaixonada e distante de descrever um tema aparentemente escandaloso: o Adultério.




Nossa comparação poderia ficar na questão do pecado? Costumes e padrões?  


Os dois romances se cruzam com características realistas muito peculiares como:


-Verossimilhança: Os argumentos se baseiam na realidade cotidiana com personagens comuns. Além disso, situam-se no contexto contemporâneo do autor e leitor.


-Presença do narrador onisciente: aquele que sabe tudo sobre a trama e os protagonistas.


-Sobriedade no estilo: Simples e sem complicações formais. O escritor busca antes de tudo a clareza e a exatidão.


E o protagonista em conflito com a sociedade cuja a solução quase sempre é o fracasso dele.


Bom, mas e amélia e Emma?


Emma e Amélia são próximas e ao mesmo tempo distantes.Vamos enaltecer aqui apenas a suas aproximação, que no contextos de ambas serem "românticas" Amélia sonhando com uma família feliz, idealizando um futuro sentimental estável. Já Emma movida pelos romances lidos, fez de sua vida semelhantemente a literatura um romance sentimental.
Mas ambas as personagens naufragam em seus ideais de vida. Imaginam, sonham, desejam semelhante vida romântica, porém são engolidas pelo caráter hipócrita de uma sociedade, que em fase de mutação, não consegue um estado fixo. Seus sonhos, desejos, são fracos diante da mentira e do caráter humano.
ambas as obras denotam uma crítica: Madame Bovary enfatiza esta crítica à família. Já O crime do Padre amaro descortina a igreja.
Ambas as obras mostram uma narrativa lenta com o tempo psicológico.
O universalismo e o Objetivismo são também marcas destes romances.


Bom, ficarei por aqui neste meu curto ensaio. Abordagens sei que são inúmeras de cada uma das obras


E gostaria de terminar meu estudo com uma singela provocação a nós leitores amargurados deste livro que se chama mundo:


"Que falta nos faz hoje um Eça de Queirós ou Um Gustave Flaubert!!!!Para descortinar, despir, desnudar.... entre tantas outras palavras que resumem o ato de não ocultar nossa realidade, de mostra-lá assim como ela é... e também mostrando a nossa nudez de alma: medos, anseios, desejos, e nosso caráter... Caráter humano. Sujeito a tantas dores e alegrias. Sujeito ao pecado e o perdão...
Queremos que nos arranque uma lágrima de sangue. E que essa lágrima possa ser a nossa redenção... Possa ser a estrela que faltava em nossa bandeira, que seja nosso brasão familiar, mas que nunca deixe de mostrar realidade assim como ela é...."










sexta-feira, 4 de maio de 2012

Ernesto Sábato & Charlie Chaplin Em: A humanização das máquinas

Dia 1 de maio! Dia do trabalhador! Em meios a tantas festas, com tantos artistas, em tantos lugares... Preferi a solidão! Diante de minha coleção de filmes escolhi um: "Tempos Modernos". - "Um filme preto e branco na era do cinema 3D?". - "Escolha esquisita!". Estas foram as palavras de minha irmã.
Passando a primeira cena do filme, ela que debochou de minha escolha, fixada com seus olhos na tela, deixou apenas fugir esta afirmação: - "Nossa, como é atual este filme!"
Em tantas cenas, minha mente não deixava de vagar em um livro: Homens e Engrenagens do escritor argentino Ernesto Sábato. Na mesma hora, aproximei as duas linguagens: o cinema e a literatura como forma de junção em um ensaio que apresento a vós, leitores inconformados!
Este ensaio tem como objetivo aproximar a obra literária "Homens e Engrenagens" (Ernesto Sábato), com o filme "Tempos Modernos" (Charlie Chaplin). Nosso exercício será trabalhar o cinema mudo de Chaplin, imaginando-o, com legendas nas cenas. A voz de Ernesto Sábato será nossa guia nesta difícil tarefa. Vamos trabalhar apenas as fotografias do filme. Selecionadas com cuidado dentro de cada cena.
VOILÀ!



Ernesto Sábato (1911-2011) foi um romancista, ensaísta e artista plástico argentino. É considerado um dos maiores escritores argentinos do século XX. Sábato afigura-se como ideólogo da geração de 1940, constituída de poetas neo-simbolistas e metafísicos. Afasta-se do mundo da razão, da ciência, para explorar o universo da conjectura, onde domina a incerteza e a incoerência.

Em seu livro (provocador) Homens e Engrenagens, Sábato trás a tona reflexões sobre o dinheiro, a razão e a derrocada de nosso tempo. (Imperdível a leitura!). O livro é composto por cinco capítulos, e dentro destes capítulos existem vários ensaios. Nos deteremos apenas no ensaio "O Paraíso Mecanizado". Para compor a apresentação do livro nada mais justo do que o próprio escritor justificando-o:
  "Refleti muito sobre o título e a qualificação que deviam portar estas páginas. Não creio que seja muito desacertado tomá-las como uma biografia espiritual, como diário de uma crise -e ao mesmo tempo pessoal e universal- como um simples reflexo da derrocada da civilização ocidental em um homem meio a um vasto caos de seres e coisas...Estas reflexões não formam um corpo sistemático, são expressão irregular de um homem de nosso tempo que se viu obrigado a refletir sobre o caos que o rodeia. E se as refutações de teorias e pessoas são muitas vezes violentas e ásperas, tenha-se presente que essa violência se exerce igualmente contra antigas ilusões minhas, que sobrevivem como letra morta, em algum livro, à sua morte em meu próprio espírito; às vezes, sobrevivem até mesmo à sua almejada morte.
Porque também podemos almejar nosso equívocos"




  Charlie Chaplin (1889-1977)É considerado por alguns críticos o maior artista cinematográfico de todos os tempos, e um dos "pais do cinema". Chaplin foi um dos atores mais famosos da era do cinema mudo, notabilizado pelo uso de mímica e da comédia pastelão. Charlie Chaplin atuou, dirigiu, escreveu, produziu e financiou seus próprios filmes.
Por sua inigualável contribuição ao desenvolvimento da sétima arte, Chaplin é o mais homenageado cineasta de todos os tempos, sendo ainda em vida condecorado pelos governos britânico (Cavaleiro do Império Britânico) e francês (Légion d 'Honneur), pela Universidade de Oxford (Doutor Honoris Causa) e pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas dos Estados Unidos (Oscar especial pelo conjunto da obra, em 1972).

E como nas palavras de Charlie Chaplin:
"Num filme o que importa não é a realidade, mas o que dela possa extrair a imaginação".
Então vamos ver até onde nossa imaginação pode alcançar...



"Os meios se transformaram em fins. O relógio, que surgiu para ajudar o homem, converteu-se hoje em um instrumento para torturá-lo. Antes, quando se sentia fome, dava-se uma olhadela no relógio para ver que horas eram. Agora o consultamos para saber se temos fome." (pag. 58)





"A velocidade de nossas comunicações valorizou até mesmo as frações de minuto e converteu o homem em um enlouquecido boneco que depende da marcha do segundeiro" (pag.58)




"A massificação suprime os desejos individuais, porque o Superestado necessita de homens-coisas intercambiáveis, como peças de reposição de uma máquina" (pag.65)






"Em nossas grandes cidades já desapareceu essa sensação do tempo cósmico: nossos altos edifícios nos impedem de acompanhar as fases da lua, a marcha das constelações, o nascer e o pôr do sol" (pag.60)




"Os teóricos do mecanicismo sustentaram que a máquina, ao liberar o homem das tarefas manuais, deixaria mais tempo livre para as atividades do espírito. Isso era a teoria. Na prática, as coisas aconteceram ao contrário: cada dia estamos mais apressados e dispomos de menos tempo" (pag.58-59)


"Os patrões, ou o Estado Patrão, buscaram a forma de aumentar o rendimento mediante a densificação do labor humano: cada segundo, cada movimento do operário, foi aproveitado ao máximo e o homem finalmente se converteu em uma engrenagem a mais no grande mecanismo capitalista ou estatal" (pag. 59)




"Eis aqui o triste fim do homem renascentista. A máquina e a ciência que ele orgulhosamente havia lançado sobre o mundo exterior, para dominá-lo e conquistá-lo, agora se voltam contra ele, dominando-o e conquistando-o como mais um objeto qualquer. Ciência e máquina foram-se distanciando até um olimpo matemático, deixando só e desamparado o homem que havia dado vida. Triângulos e aço, logaritmo e eletricidade, sinusoides e energia atômica, estranhamente unidas às formas mais misteriosas e demoníacas do dinheiro, constituíram finalmente a Grande Engrenagem, da qual os seres humanos acabaram sendo obscuras e importantes peças" (pag.66)

 - Nossa, como é atual este filme! Volto aqui as palavras de minha irmã para dar continuidade ao nosso ensaio. As duas linguagem formam uma cena em nossas mentes; O trabalho.
A palavra Trabalho em sua etimologia, vem de tripalium (ou trepalium), do Latim Tardio, um instrumento romano de tortura, uma espécie de tripé formado por três estacas cravadas no chão, onde eram supliciados os escravos. Reúne o elemento " tri" (três) e " palus" (pau) - literalmente, "três paus". Bom, muitos hoje em dia acham o seu trabalho torturante não é mesmo? Mas a mensagem que quero transmitir aqui com as nossas inquietações vai além...
O título do nosso ensaio constitui em: "A Humanização das máquinas", mas poderia chamar-se também de "A Desumanização do homem", pois o que vemos a cada dia mais e mais é o homem desorientado, desraizado do mundo. Mundo este em que ele não pode ser apenas meros observadores, e engrenagens... ele deve lutar. Lutar por que? 
Outrora, o mesmo homem venceu  as dificuldades exposta à ele pela natureza: frio, calor, gelo, água... mas a cada superação do homem ele vivia mais prazerosamente. Hoje, o homem deixou de viver para sobreviver...
O homem sobrevive... e,  enquanto ele não deixar morrer a arte como um todo, ainda temos esperança de um mundo em que deixaremos de sobreviver para vivermos Intensamente. E obras como a de Charlie Chaplin e Ernesto Sábato, trabalham em nós como uma marreta. Derrubando cada muro de certezas e confianças que temos, e através de ruínas, e entulhos de nós mesmos, voltamos a grande tarefa de construir-nos bases, alicerces e colunas mais fortes para os nossos sentidos.


"A vida é maravilhosa se não se tem medo dela".

(Charlie Chaplin)