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segunda-feira, 31 de outubro de 2011

O Barroco pelos olhos de El Greco e Gregório de Matos Guerra

o seguinte ensaio tem como objetivo comparar a obra do pintor barroco Doménikos Theotokópoulos mais conhecido como El Greco, com o poeta Gregório de Matos Guerra (conhecido como Boca do inferno).
Para tal finalidade abordaremos a pintura  "Crucificação" de El greco, usando a mesma como sombra do poema  "Buscando a Cristo" de Gregório de Matos. Traremos a baila o diálogo que ambas as obras fazem no quesito paradoxal da época do barroco.
O Barroco foi uma tendência artística que se desenvolveu primeiramente nas artes plásticas e depois se manifestou na literatura, no teatro e na música. Marcado por uma visão pessimista de vida- consequência de uma profunda crise econômica e social e da desilusão com os ideais humanistas e do Renascimento.
A Arte Barroca expõe a tensão pela qual passa o homem seiscentista, pressionado entre o antropocentrismo e o teocentrismo. O Barroco é caracterizado pelo conflito, pelo jogo dos opostos, pelo emprego de símbolos que revelam a instabilidade das coisas e a efemeridade de tudo. Assim temos tais características na pintura de El Greco:

Notamos o jogo de opostos entre as nuvens Brancas e as Negras, misturando-as  em um conflito que pode ser traduzido como Pureza e Pecado; Dia e Noite; Trevas e Luz. Mas notamos também que mesmo diante de tal conflito, o corpo de Cristo não recebe as trevas, ele simplesmente enaltece a luz.
A também a imagem dos dois homens. O da esquerda com suas vestes brancas representa a santidade, porém tal santidade recebe em seu pescoço um laço negro, podendo assim dar um sentido de oposto. A santidade estando manchada pelo sofrimento de Cristo. O homem do lado direito todo de negro representa o pecado dos homens; manchados pelo erro, porém outro oposto nos aparece, pois no pescoço do homem de preto está um laço branco. Mostrando assim que mesmo pelo pecado, pela mancha de erro dos homens, a misericórdia para humanidade. Enquanto as mãos do homem de branco se juntam as do homem de preto se separam.  O corpo físico estava se separando da terra, porém o corpo incorruptível estava unindo Cristo, Deus e os Homens. Se podemos traduzir essa obra em uma palavra, ousamos dizer : Conflito. Ao mesmo tempo que Choca-nos, purifica-nos.
E este mesmo êxtase místico que vive o Cristo na pintura de El Greco, e bem declarado no ´poema de Gregório de Matos:
Buscando a Cristo
A vós correndo vou, braços sagrados, 
Nessa cruz sacrossanta descobertos 
Que, para receber-me, estais abertos, 
E, por não castigar-me, estais cravados. 
  
A vós, divinos olhos, eclipsados 
De tanto sangue e lágrimas abertos, 
Pois, para perdoar-me, estais despertos, 
E, por não condenar-me, estais fechados. 
  
A vós, pregados pés, por não deixar-me, 
A vós, sangue vertido, para ungir-me, 
A vós, cabeça baixa, p'ra chamar-me 
  
A vós, lado patente, quero unir-me, 
A vós, cravos preciosos, quero atar-me, 
Para ficar unido, atado e firme.

Podemos constatar nesses versos a consciência do pecado, mas também o arrependimento. O eu lírico sofre pelo seus conflito existencial: "céu e inferno" vivendo no mesmo corpo, na mesma consciência.
 Gregório de Matos atribui um sentido simbólico no corpo de Cristo; refúgio, proteção, escudo, refrigério e paz. Mas no mesmo corpo, há tortura, condenação, dor, julgamento.
O poeta trás de forma brilhante o simbolo do Cristianismo como algo contraditório, conflituoso. O poeta usa de figuras de linguagem como a hipérbole que transmite com muita profundidade e exagero a visão de mundo do ser. Esse exagero é muito bem mostrado no conflito da pintura entre as nuvens brancas e negras. Há também "antíteses" marcando todo o poema.
No último terceto, o desejo de união espiritual com Cristo é representado pela consagração de união física ("Para ficar unido, atado e firme") um exemplo de "fusionismo" (desejo de humano de unir-se a Deus) pode ser representado pelo seguinte corte da pintura El Greco:



Tratando-se de duas formas  diferentes de artes: Literatura e Pintura, tentamos no decorrer do texto mostrar o diálogo que ambas fazem no percurso do Barroco. E ao mesmo tempo podemos entender que tal "Barroco", nunca distanciou-se do homem. Atravessou e superou a linha do tempo, pois;

"Quem não é um ser conflitante neste mundo? Quem não é cercado entre luz e trevas. O homem Barroco nunca morreu. ele vive até hoje. Basta-nos olhar ao espelho, então saberemos  que ele vive em cada um de nós"