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quinta-feira, 29 de março de 2012

O Poder da Natureza nos versos de Emily Dickinson e Cecília Meireles

Este ensaio tem como objetivo central aproximar os versos da poetisa americana Emily Dickinson com os versos da poetisa brasileira Cecília Meireles.
Nosso eixo central nesta empreita vai desembarcar no poder da natureza como um "todo" na poesia de ambas autoras. E como a natureza com sua simbologia conduz as palavras em uma entrega que vai além de comparações; flores, sol, céu, arvores, campo, chuva e vento enaltece os versos de cada autora mostrando uma simbologia gratificante conduzindo o homem a enxergar que a terra não pertence a ele, mas que nós é que somos propriedade da  Terra. Indiferente de qualquer pedaço de chão em qualquer parte deste planeta; somos frutos de nossa mãe Terra. E devemos aprender com ela o sentido de viver.


Emily Dickinson (1830-1886) é tida, hoje como um dos maiores nomes da poesia norte-americana.


Nasceu em 1830 em Amherst, Massachusetts. Ao morrer em 1886, deixou 1775 poemas. Sendo publicados aos poucos até que em 1955 sua obra foi publicada integralmente.
Com temas tais como: a natureza, a morte, a religião, a solidão conquistou seu nome no cânone literário como uma das vozes mais introspectivas e misteriosas da literatura.
Notamos esses temas no seu poema



Bee! I'm expecting you!


Bee! I'm expecting you!
Was saying Yesterday
To Somebody you know
That you were due—


The Frogs got Home last Week—
Are settled, and at work—
Birds, mostly back—
The Clover warm and thick—


You'll get my Letter by
The seventeenth; Reply
Or better, be with me—
Yours, Fly. 


Tradução (Isa Marà Lando)


Abelha! Espero por ti!
Abelha! Espero por ti!
Ontem mesmo eu ia falando
Para alguém que tu conheces
Que logo estarás chegando-


Semana passada voltaram as Rãs-
Estão bem instaladas, no seu afã-
As aves, quase todas aqui novamente-
O Trevo, espesso e quente-


Receberás  minha carta lá pelo
Dezessete; responde
Ou melhor, vem ter comigo urgente-
Tua amiga Mosca, Cordialmente


Para a nossa simples percepção notamos apenas que se trata de uma simples carta escrita por uma "mosca" para uma "abelha"; aos poucos vamos nos dar conta de que a inocência das palavras esconde um sentido complexo na imagem.O que simboliza a Abelha? E a Mosca? E a volta das Rãs?
A abelha extrai seu alimento das flores e vive em perfeita organização social, por isso, tornou-se um símbolo de pureza e disciplina. Simboliza pureza (por ser um animal que vive entre as flores), disciplina (devido à organização exemplar das colmeias), trabalho (pela atividade incessante das abelhas operárias) e realeza (o poder exercido pela abelha rainha é reconhecido e respeitado por todas as outras). Na Grécia antiga, era o símbolo das sacerdotisas de Éfeso e Elêusis, que se chamavam “abelhas” e que preservavam a virgindade da mesma forma que as abelhas operárias. Entre os cristãos, representa o Espírito Santo.
Conforme citamos, a poetisa tem como forte em seus temas a religião. A abelha que fabrica o mel, uma alimento sagrado está associado a sua alma. O eu-lírico clama com fome do alimento para o seu espírito. E o próprio Eu-lírico compara-se a uma "Mosca"
A mosca no antigo Egito era considerada um símbolo de valor indomável, de insistência e de tenacidade.
Já na cultura cristã, a mosca é relacionada com a "Morte"; multiplica-se quando algo está em decomposição, apodrecendo.
A mosca zela pela chegada da abelha para trazer o alimento, a vida. Para o seu momento de decomposição. É a voz do eu-lírico clamando diante da ilusão que é o mundo.
E a chegada das Rãs?
As rãs, semelhantes  ao sapo é um animal mágico e xamânico por excelência, ensina a “saltar” para outros níveis de consciência e deste para o “outro mundo”O sapo também significa evolução.
Notamos que a chegada das Rãs simbolizam a evolução da vida. É a angustia por ter contemplar a vida diante do escasso, da solidão, da morte.
O poema é uma busca de esperança de alguém que está sofrendo no seu espírito por falta de vida. Conforme as palavras: "Nem só de pão viverá o homem...." A falta aqui é do mel, que simboliza a doçura, a paz...



Semelhantemente....

Cecília Meireles (1901-1964) É considerada a primeira grande poetisa brasileira. Nunca esteve ligada a nenhum movimento literário.

A presença constante em sua poesia de elementos da natureza, espiritualidade e musicalidade confere ao seu trabalho um caráter fluido e etéreo, que permite a sua aproximação ao neo-simbolismo
Filha de Carlos Alberto de Carvalho Meireles, funcionário do Banco do Brasil S.A., e de D. Matilde Benevides Meireles, professora municipal, Cecília Benevides de Carvalho Meireles nasceu em 7 de novembro de 1901, na Tijuca, Rio de Janeiro. Foi a única sobrevivente dos quatros filhos do casal. O pai faleceu três meses antes do seu nascimento, e sua mãe quando ainda não tinha três anos. Criou-a, a partir de então, sua avó D. Jacinta Garcia Benevides.
Dessas angústias e tristezas de sua vida, criou além de seu contexto. Sua voz é ouvida e aclamada por muitos. Sues versos são belos.
Mas a natureza foi um fator primordial de seus versos como podemos notar adiante:

Inscrição
sou entre flor e nuvem,
estrela e mar.
Por que havemos de ser unicamente humanos,
limitados a chorar?

Não encontro caminhos
fáceis de andar
Meu rosto vário desorienta as firmes pedras
que não sabem de água e de ar.

E por isso levito.
É bom deixar
um pouco de ternura e encanto indiferente
de herança, em cada lugar.

Rastro de flor e estrela,
nuvem e mar.
Meu destino é mais longe e meu passo mais rápido:
a sombra é que vai devagar

Notamos nos versos da poetisa a contradição que vive o eu-lírico; na verdade um estado paradoxal.
O estado de fixação é constante, porém a nuvem;  (reveste-se simbolicamente de diversos aspectos, dos quais os mais importantes dizem respeito à sua natureza confusa e mal definida, à sua qualidade de instrumento das apoteoses e das epifanias). Neste estado o eu-lírico é levado pelas forças dos ventos de sua vida.
A flor (simboliza a beleza, a perfeição, o amor, a glória e a alegria, mas também a entrega a Deus, a evolução espiritual e a própria alma. A flor é também um símbolo feminino, ligado ao elemento água, ao planeta Lua e, consequentemente, à criação, à fertilidade e ao nascimento).
A nuvem é um elemento que está ligado ao céu, enquanto a flor está associada a terra.
O grande enigma no poema é construção metafísica entre o céu e a terra (alma e corpo; espiritual e material;) e o eu-lírico entre essas duas vidas e dois caminhos, tende a se questionar:
seguir os caminhos da alma, deixando-se levar como uma nuvem misteriosa através do ar, ou permanecer fixo como uma flor desabrochando no tempo certo, exalando perfumes de tempo e tempo, mas limitada ao espaço que foi dado para ela nascer, crescer, viver e multiplicar-se (corpo)?

E no final de tudo corpo e alma forma um todo que mistura através do brilho de uma estrela com a delicadeza de uma flor, e o mistério de uma nuvem com a imensidão do mar que representa a energia vital inesgotável, o abismo, o inconsciente e tudo o que se encontra oculto.
É simplesmente o mistério que cerca a todos nós.

Tanto Emily Dickinson quanto Cecília Meireles, numa perspectiva nova, outro modo de ver, que vê o que se não ´pode ser visto, com a força nas palavras que transformam paisagens e estações em significados humanos. E sempre nos mostrando que a natureza nunca saiu de dentro do homem, pois: 

"O homem não teceu a teia da vida – ele é meramente um fio dela".





7 comentários:

  1. Ai que blog bom... demais! Estarei sempre por aqui... abraço

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    Respostas
    1. Agradeço pelo elogio... E pelo comparecimento!
      grato.
      Danilo Pereira

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  2. Olá, Danilo,

    Apreciei a comparação e seus comentários, bastante didáticos, mostram uma perspectiva das poetisas que não se vê por aí.

    Abraço do Pedra do Sertão

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    Respostas
    1. Agradecido pelas ternas palavras.
      A literatura tem esse poder: de sempre surpreender-nos a cada leitura. E a poesia?
      Essa sim sempre há de ser inacabada; sempre por fazer e fazer-nos

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  3. Respostas
    1. A literatura tem esse sabor delicioso:
      de sonho com cobertura de tempo recheado de mistério.
      Grato pela degustação...
      Danilo Pereira

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  4. Danilo: Lemos na poesia de Emily e Cecília o mesmo diálogo com a natureza. Escrevi uma tese intitulada "Imagens da Natureza na Poesia de Emily Dickinson e Cecília Meireles". São os caminhos cruzados da literatura...

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