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quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

"A saudade do passado em Drummond e Cartola"

O objetivo deste ensaio é aproximar a poesia de Carlos Drummond de Andrade com as canções do compositor Angenor de Oliveira mais conhecido como "Cartola". Para esse fim, faremos uma comparação entre o poema "Ontem" de Drummond e a música "Canção de Saudade" de Cartola.

Considerado um poeta de alma e ofício, Drummond nasceu na cidade de Itabira em Minas Gerais. sua vida e obra é muito importante, porém pularemos esta parte pela sua extensão. focaremos mais em sua poesia. Uma poesia de questionamento da existência humana, do sentimento de "estar no mundo", das inquietações sociais, religiosas, filosóficas, e amorosas formaram a base para um dos principais poetas brasileiros de todos os tempos.









Já...

Angenor de Oliveira (Cartola) é considerado por muitos críticos de música como o maior sambista e uns dos maiores compositores da música brasileira. Cartola foi um dos fundadores da escola de samba do Rio de Janeiro "Estação Primeira de Mangueira". infância pobre, dificuldades financeiras, mortes, foram características que  transpassaram a carreira e a vida desse grande compositor. Mas sua obra nem por isso herdou suas dificuldades, pelo contrário, ela é rica e seus versos até hoje fazem sucesso.


vamos à comparação:
Para análise escolhemos o poema de Drummond "Ontem" que está publicado no livro "A rosa Do Povo".
Ontem
Até hoje perplexo
ante o que murchou
e não eram pétalas.

De como este banco
não reteve forma,
cor ou lembrança.

Nem esta árvore
balança o galho
que balançava.

Tudo foi breve
e definitivo.
Eis está gravado

não no ar, em mim, 
que por minha vez
escrevo, dissipo.

podemos notar nos versos do poeta um sentimento de saudade do passado por ele ser breve e definitivo, porém mesmo rápido ficou gravado em sua memoria. a Passagem do tempo refere a própria existencia humana. Não foram as pétalas da flor que murchou, não foram apenas as folhas das arvores que caíram. O poeta sofre  por saudade do passado onde tudo era mais revigorante, mais vivo, mais intenso.

já...
Canção de Saudade
Tudo de alegrias e de tristezas conheci,
Coisas do amor e do sofrer, eu já senti,
Nada me transforma a alegria de viver,
Ver a noite vir e sorrir, ao sol nascer,
Vivo esperando o novo dia,
Que irá trazer a luz, que sempre ficará !



 nestes versos, o compositor além de exaltar a vida, sofre também pela esperança de um dia que será maior do que os de outrora. O compositor semelhantemente ao poeta, tem guardado em si mesmo as marcas da vida e do tempo: Tristezas e alegrias (conheci); Amor e sofrimento (senti)
Ele exalta a vida, mas espera um dia melhor. Sem fim.
 A saudade é um tema que articula bastante a obra de Drummond e de Cartola.
A palavra saudade é uma das palavras mais usadas dentro da língua portuguesa. Principalmente na poesia e na Música. Descreve a mistura dos sentimentos de perda, distância e amor.
Nas duas obras a saudade é pela distância de um tempo que não poderá mais voltar.  A perda deste tempo faz, os autores a se entregarem em uma lembrança que para o poeta onde a natureza transformo-se e o transformou, diante desta perplexidade, só a uma coisa a fazer: escrever!. E sua escrita marcada pela saudade é dissipada. Seus versos são lançados com o propósito de reviver novamente suas lembranças.

Já Cartola, espera fielmente o novo dia que irá trazer a glória maior que a do passado, porém  nada transforma a alegria que o compositor tem pelo viver. Ele vive com uma esperança que substituirá os amores, os sofrimentos, as alegrias do passado, e esperando ele canta sua saudade através da música.

 Drummond escreve, dissipa. sendo assim revive seu passado. 
Cartola canta, vive e espera. Com muita esperança, lembrando do passado esperando uma nova luz, onde esta ficará para sempre.

A saudade é o ponto primordial entre as obras. 
Interessante é que a três dia da morte de Cartola, Drummond escreve uma crônica no jornal do Brasil intitulada; Cartola, no moinho do mundo

E nesta crônica, Drummond escreve:
"Esse Cartola! Desta vez, está desiludido e zangado, mas em geral a atitude dele é de franco romantismo, e tudo se resume num título: Sei Sentir. Cartola sabe sentir com a suavidade dos que amam pela vocação de amar, e se renovam amando. Assim, quando ele nos anuncia: “Tenho um novo amor”, é como se desse a senha pela renovação geral da vida, a germinação de outras flores no eterno jardim. O sol nascerá, com a garantia de Cartola. E com o sol, a incessante primavera".

Tanto Cartola, como Drummond nos encantam com suas palavras e nos deixam provocados a sentir saudade, mas não uma saudade em que nos lamentamos. Mas uma saudade em querer mais sentimento, mais poesia, mais música com qualidade que nos façam viver intensamente. E principalmente mais vida. Mas... enquanto isso... 
Que saudade eu tenho....




segunda-feira, 31 de outubro de 2011

O Barroco pelos olhos de El Greco e Gregório de Matos Guerra

o seguinte ensaio tem como objetivo comparar a obra do pintor barroco Doménikos Theotokópoulos mais conhecido como El Greco, com o poeta Gregório de Matos Guerra (conhecido como Boca do inferno).
Para tal finalidade abordaremos a pintura  "Crucificação" de El greco, usando a mesma como sombra do poema  "Buscando a Cristo" de Gregório de Matos. Traremos a baila o diálogo que ambas as obras fazem no quesito paradoxal da época do barroco.
O Barroco foi uma tendência artística que se desenvolveu primeiramente nas artes plásticas e depois se manifestou na literatura, no teatro e na música. Marcado por uma visão pessimista de vida- consequência de uma profunda crise econômica e social e da desilusão com os ideais humanistas e do Renascimento.
A Arte Barroca expõe a tensão pela qual passa o homem seiscentista, pressionado entre o antropocentrismo e o teocentrismo. O Barroco é caracterizado pelo conflito, pelo jogo dos opostos, pelo emprego de símbolos que revelam a instabilidade das coisas e a efemeridade de tudo. Assim temos tais características na pintura de El Greco:

Notamos o jogo de opostos entre as nuvens Brancas e as Negras, misturando-as  em um conflito que pode ser traduzido como Pureza e Pecado; Dia e Noite; Trevas e Luz. Mas notamos também que mesmo diante de tal conflito, o corpo de Cristo não recebe as trevas, ele simplesmente enaltece a luz.
A também a imagem dos dois homens. O da esquerda com suas vestes brancas representa a santidade, porém tal santidade recebe em seu pescoço um laço negro, podendo assim dar um sentido de oposto. A santidade estando manchada pelo sofrimento de Cristo. O homem do lado direito todo de negro representa o pecado dos homens; manchados pelo erro, porém outro oposto nos aparece, pois no pescoço do homem de preto está um laço branco. Mostrando assim que mesmo pelo pecado, pela mancha de erro dos homens, a misericórdia para humanidade. Enquanto as mãos do homem de branco se juntam as do homem de preto se separam.  O corpo físico estava se separando da terra, porém o corpo incorruptível estava unindo Cristo, Deus e os Homens. Se podemos traduzir essa obra em uma palavra, ousamos dizer : Conflito. Ao mesmo tempo que Choca-nos, purifica-nos.
E este mesmo êxtase místico que vive o Cristo na pintura de El Greco, e bem declarado no ´poema de Gregório de Matos:
Buscando a Cristo
A vós correndo vou, braços sagrados, 
Nessa cruz sacrossanta descobertos 
Que, para receber-me, estais abertos, 
E, por não castigar-me, estais cravados. 
  
A vós, divinos olhos, eclipsados 
De tanto sangue e lágrimas abertos, 
Pois, para perdoar-me, estais despertos, 
E, por não condenar-me, estais fechados. 
  
A vós, pregados pés, por não deixar-me, 
A vós, sangue vertido, para ungir-me, 
A vós, cabeça baixa, p'ra chamar-me 
  
A vós, lado patente, quero unir-me, 
A vós, cravos preciosos, quero atar-me, 
Para ficar unido, atado e firme.

Podemos constatar nesses versos a consciência do pecado, mas também o arrependimento. O eu lírico sofre pelo seus conflito existencial: "céu e inferno" vivendo no mesmo corpo, na mesma consciência.
 Gregório de Matos atribui um sentido simbólico no corpo de Cristo; refúgio, proteção, escudo, refrigério e paz. Mas no mesmo corpo, há tortura, condenação, dor, julgamento.
O poeta trás de forma brilhante o simbolo do Cristianismo como algo contraditório, conflituoso. O poeta usa de figuras de linguagem como a hipérbole que transmite com muita profundidade e exagero a visão de mundo do ser. Esse exagero é muito bem mostrado no conflito da pintura entre as nuvens brancas e negras. Há também "antíteses" marcando todo o poema.
No último terceto, o desejo de união espiritual com Cristo é representado pela consagração de união física ("Para ficar unido, atado e firme") um exemplo de "fusionismo" (desejo de humano de unir-se a Deus) pode ser representado pelo seguinte corte da pintura El Greco:



Tratando-se de duas formas  diferentes de artes: Literatura e Pintura, tentamos no decorrer do texto mostrar o diálogo que ambas fazem no percurso do Barroco. E ao mesmo tempo podemos entender que tal "Barroco", nunca distanciou-se do homem. Atravessou e superou a linha do tempo, pois;

"Quem não é um ser conflitante neste mundo? Quem não é cercado entre luz e trevas. O homem Barroco nunca morreu. ele vive até hoje. Basta-nos olhar ao espelho, então saberemos  que ele vive em cada um de nós"



quinta-feira, 7 de julho de 2011

Uma tarde com Pablo Neruda e Vinicius de Moraes






O objetivo desse ensaio é aproximar a obra do poeta chileno Pablo Neruda com a poesia de Vinicius de Moraes. Para tal procedimento, focaremos a imagem da “tarde” na obra dos dois poetas.  De Vinicius de Moraes separamos a letra e música: “Tarde em Itapuã”. Na obra do poeta Pablo Neruda, separamos a poesia: “Uma Tarde” que está inserido no livro de poemas O rio Invisível.
O porquê de uma tarde?
A palavra tarde significa em termos objetivos e simples o tempo entre o meio-dia e a noite. Mas como nosso objetivo traduz mais o lado subjetivo do termo, pois a literatura nos favorece a tal... A tarde simboliza o momento que nem é o início e nem o fim. Fazendo uma comparação simples, podemos dizer que o amanhecer é o início, a tarde o desenrolar; e a noite o fim. Também pode ser o passado, o presente e futuro, basta o ponto de vista de cada um.
No nosso ensaio, trabalharemos o conceito de tarde na vida do eu lírico. E o mais surpreendente é como ambos os poetas se parecem!

A palavra tarde deu origem a muitos termos: entardecer; tardio; tardo; tardança; que em suas essências mostram um momento ajustado, um tempo que anda vagarosamente. Um bom exemplo dessa afirmação é quando notamos essa imagem na música de Vinicius:
Um velho calção de banho
Um dia prá vadiar
O mar que não tem tamanho
E um arco-íris no ar...
Depois, na Praça Caymmi
Sentir preguiça no corpo
E numa esteira de vime
Beber uma água de côco
Percebemos o momento do poeta andando vagarosamente... Sem nenhuma preocupação, vivendo à tarde!

Já nos versos de Pablo Neruda:
A lua refugiou-se na montanha/deixando-nos velada claridade;
Esta luz amorosa que nos banha/ encheu toda a minh’alma de suprema bondade.
Percebemos um encantamento que traduz uma imagem de paz.
Para os dois poetas a tarde chegou para curar o cansaço e a ilusão da manhã. E a grandeza “destas tardes” é traduzida na imagem da natureza: “o mar que não tem tamanho”; “a lua refugiou-se na montanha”. Esta imagem da natureza nos remete ao homem reconhecendo o seu estado de humano e reconhecendo-se na própria natureza. Os poetas praticamente se embebedam diante da imagem. Imagem que transcende o momento de vida de cada um. É o encontro da paz interna e externa.
O poeta Neruda canta em seus versos ainda:
“senti todas as folhas se agitarem/ cantando no silêncio uma canção”;
“E senti meu espírito afasta-se as asas perseguindo de uma bela ilusão”

Agora nos verso de Vinicius de Moraes:
Depois sentir o arrepio
Do vento que a noite traz
E o diz-que-diz-que macio
Que brota dos coqueirais...
E nos espaços serenos
Sem ontem nem amanhã
Dormir nos braços morenos
Da lua de Itapuã
É bom!...
O momento que ambos os poetas contemplam parece um sonho. Para Neruda: “uma bela ilusão” já para Vinicius um momento mitológico, “dormi nos braços morenos da lua de Itapuã”. Aqui percebemos a importância do símbolo vento. Ele é responsável por trazer o “agitar” da vida, mas também responsável por trazer a brisa macia, serena que tanto acalma o eu lírico.

Sendo assim, podemos concluir que tanto os versos de Vinicius de Moraes como os de Pablo Neruda traduzem um momento que traz sobre todas as circunstâncias a paz.
E a tarde nos trás um ensinamento poderoso: que todos os tempos são efêmeros, porém basta olharmos para tudo que nos cerca, mesmo no centro de um caos, não podemos deixar de viver. Viver INTENSAMENTE!!! Pois daqui a pouco será a noite, faltará a luz e a beleza da paz que uma tarde pode nos proporcionar!
ENTÃO NÃO DEIXE DE VISLUMBRAR UMA TARDE! UMA TARDE VAGAROSA E PRAZEROSA!







segunda-feira, 23 de maio de 2011

A solidão do homem e o silêncio da humanidade em “Eu sou a lenda” e o “Dono do mundo”


O objetivo deste ensaio é comparar uma obra literária O Dono do Mundo de Plínio Salgado com o filme “Eu sou a lenda" (2007)
Embora a comparação agora se dê em dois mundos diferentes, mas, entretanto são mundos muito parecidos também, pois notamos muitas adaptações de obras literárias para o cinema. Não acho que o "Dono do mundo" tenha inspirado o filme “Eu sou a lenda”. Embora haja muitos aspectos interessantes entre as duas obras. Os principais deles serão nosso apoio para a comparação:
- “A solidão” e o “silêncio”
Pois tanto solidão e silêncio é o momento em que o individuo mergulha em si próprio. É uma reflexão que traz sempre algo novo.

Nas duas obras notamos o sujeito isolado. No filme, o protagonista Robert Neville (Will Smith) é cercado e isolado na cidade de Nova York, rodeados de outros seres que pelo contato com um vírus sofreram uma mutação que desmanchou todo o aspecto de “Homem” transformando assim em um ser que não pode sair de dia, preferindo a escuridão e se alimentando de sangue...                  


Na obra de Plínio notamos o sujeito isolado, sozinho sem ter a mínima idéia do que houve, mas também sofrendo com certos seres, aqui incorporados nas roupas de todos os humanos. Essas roupas na obra nos mostram certo aspecto de fantasmas. Como tudo evoca vida apenas na mente do protagonista; casas, carros; museus, igrejas é tudo que estou de uma humanidade inteira.


Plínio Salgado adotou nesse romance um tom profético, afirmando que o apocalipse chegará com o desenvolvimento tecnológico e o advento das máquinas, expressões da força urbanística e que não são o mais correto para a defesa nacionalista devido à influência externa existente.
No filme No ano de 2009, uma grande descoberta científica irá mudar o mundo: a cura contra o câncer. O que deveria ser a dádiva do século torna-se um desastre mundial, dizimando 95% da população do planeta.
Será a ciência a causadora do apocalipse? Bom nas duas obras é bem enaltecido essa característica.
O enredo do romance ocorre em meados da década de 1970, na cidade de Ouro Claro, em Minas Gerais, e tem como personagem central o engenheiro Pedro Adamus. Ele aproveita um domingo de sol para fazer manutenção em um dispositivo da mina em que trabalhava e que andava mal toda semana. Seu desejo era voltar para casa rapidamente, pegar seu monomotor e ir à Lagoa Prateada, passar o dia com sua esposa Silvia e seus filhos, Maria e Paulinho. Na mina, Adamus desce todos os pavimentos e chega ao local para realizar seu ofício. Ali todos os convívios humanos pareciam impossíveis, remotas lembranças. Em um dado momento a máquina começa a querer falar com Adamus, que foge daquele desespero: As máquinas, na convivência numerosa dos seres humanos, ainda as mais perfeitas e tão perfeitas que só lhes falta falar [...] Mas a máquina sozinha com um único Ser Humano nas entranhas cadavéricas da terra insensível e fria, assombra e esmaga, num domínio arrasador.
 O fato faz parte de uma experiência ocorrida no oceano glacial ártico, na ilha de Spitzberg, onde um sábio elabora uma emanação super magnética sutil e silenciosa com o objetivo de eliminar todos os seres humanos sem deixar vestígios. No momento da experiência, Adamus estava quilômetro abaixo da terra e não é atingido pela emanação. Ao retornar à superfície, percebe o desaparecimento de todos os seres humanos: pelas ruas e casas, apenas suas roupas e objetos jogados; a cidade está completamente deserta. Adamus inicia uma peregrinação pelo Brasil e depois pelo mundo em busca de uma explicação do sumiço. Na capital, Belo Horizonte, tudo está deserto.
Plínio Salgado coloca Adamus como uma vítima do cosmopolitismo:

“No meio de centenas de máquinas a ocupar vasto espaço Adamus subiu a uma escada e bradou: - Máquinas! Fostes a mais poderosa oligarquia de todos os tempos! Vosso poder terminou. Voltastes a ser escravas e não mais senhores. Máquinas, eu – dono do mundo – sou o único e poderoso senhor a quem deveis obedecer”!

Esse mesmo orgulho é visto no filme quando o Dr. Neville é salvo por uma mulher e um menino. Depois de acordado ele fica furioso por notar que ele não haviam sidos contaminados. Chega ao ponto de não acreditar na própria visão, pois sua única válvula de escape era sua cadela...

Deixo uma fagulha apenas e uma provocação para os amantes da boa literatura (aquela que sempre permanecerá viva a cada leitura mostrando algo novo), que este pequeno ensaio sirva para grandes comparações e novas leituras. E fica a seguinte pergunta:

O que será nossa válvula de escape neste mundo?





segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Memórias do Subsolo sobre um Leite Derramado





O objetivo deste ensaio é fazer uma comparação de personagem principal, tanto da obra Memórias do Subsolo ( Fiódor Dostoiévski) com a obra  Leite Derramado (Chico Buarque de Holanda).
A obra literária do russo Fiódor Dostoiévski (1821-1881) é considerada pela crítica como uma obra filosófica. Em especial “Memórias do Subsolo” retrata bem esses aspectos tão intensos do pensamento humano. É um romance dramático e com muita força emocional em que manifesta uma introspecção verrumante contida na voz do protagonista, voz por excelência polifônica, pois anuncia as vozes da sociedade em que ataca o racionalismo e o princípio econômico.
O homem do “subsolo” é aquele que está abaixo de tudo, o homem em seu esconderijo, e por estar nessa situação, esse homem, investe ferozmente contra a ciência, superstição, progresso, etc. Mas acima de tudo contra o solo da consciência.
Seu protagonista é um homem de 40 anos, vivendo em um lar precário, sofrendo do fígado. E reclamando de tudo na sociedade. Esse personagem se coloca acima de todos os homens, mas vive esse paradoxo, por este estar abaixo da sociedade. É o homem que se considera maior, mas é incapaz de subir ao patamar dos “simples homens”, assim sendo, nos dá entender que em qualquer século e em quaisquer sociedades, o homem sempre será um paradoxo; (extrapola o senso comum, ou seja, a lógica).
Já em Leite Derramado, o protagonista é um velho de 100 anos de idade que está em um leito de hospital esperando o fim de sua vida. E nesta rotineira paciência ele desfia um monologo dirigido a quem quiser ouvir de suas memórias, mostrando a saga de sua família marcada pela decadência e pelo sofrimento.  O velho se chama Eulálio (que significa bom orador), só fala pelos cotovelos, embaralhando o tempo, retratando acima de tudo a trajetória do Brasil e mostrando que crescemos sobre a sombra da escravidão. O narrador é frio e arrogante.
Se em Memórias do subsolo temos um homem que se vê como superior, mas incapaz, pois não tem nem sequer o solo a apoiar-se. Em Leite Derramado temos o homem vivendo em plena decadência, o típico proprietário sem propriedade. Daí apenas uma das comparações entre esses personagens.
Foquemos no primeiro parágrafo de Leite Derramado:
“Quando eu sair daqui, vamos nos casar na fazenda da minha feliz infância, lá na raiz da serra. Você vai usar o vestido e o véu da minha mãe, e não falo assim por estar sentimental, não é por causa da morfina. Você vai dispor dos rendados, dos cristais, da baixela, das jóias e do nome da minha família. Vai dar ordens aos criados, vai montar no cavalo da minha antiga mulher”.
Agora focamos no primeiro parágrafo de Memórias do Subsolo:
“Sou um homem doente... Um homem mau. Um homem desagradável. Creio que sofro do fígado. Alias, não entendo níquel da minha doença e não sei, ao certo, do que estou sofrendo. Não me trato e nunca me tratei, embora respeite a medicina e os médicos. Ademais, sou supersticioso ao extremo; bem, ao menos o bastante para respeitar a medicina. (Sou suficientemente instruído para não ter nenhuma superstição, mas sou supersticioso.”)
Nos dois textos entendemos uma voz sofrida, amargurada contento apenas a dor. Em Leite Derramado, o personagem diz: “Quando eu sair daqui, vamos nos casar na fazenda da minha feliz infância (...); acentuando que a infância é melhor do que a realidade de hoje, invocando assim um tempo que só existirá na nossa memória, que não voltará, e por isso sofremos.
(...) “não é por causa da morfina (...)” note-se nessa frase a riqueza de significados. Morfina é o medicamento que alivia a dor, aqui temos tanto uma dor carnal, por Eulálio estar morrendo, e uma dor espiritual. Mas essa dor espiritual Eulálio só alivia com a sua “feliz infância.”
Agora em Memórias do Subsolo quando o protagonista diz nessa sequencia decrescente: “Sou um homem doente... Um homem mau. Um homem desagradável. Essa sequencia dá para perceber que o narrador vai se rebaixando, por a lógica sugerir que “estar” desagradável gera o mau e o mau físico gera a doença. Isso só mostra que esse homem sofre de uma dor maior que a física: “a dor da consciência”
 “Não me trato e nunca me tratei, embora respeite a medicina e os médicos”. Esse tratamento não é apenas físico, é também psicológico. O narrador é orgulhoso, não aceita ajuda.  “medicina e médicos aqui está expondo o tratamento da sociedade. O narrador respeita, mas não necessita da ajuda. Tem que passar por tudo isto como um fado que carrega. Sua fraqueza o impede de pedir ajuda.
Embora escritas em tempos diferentes, nas duas obras há um interesse familiar: descortinar a alma do ser humano e suas inquietudes, angústias, sonhos, desejos e principalmente sua dor. Dor existencial.




sábado, 29 de janeiro de 2011

"O velho e o mar" e "Jesus de Nazaré"


O velho e o mar (1952) é o livro mais popular de Ernest Hemingway. Conta a historia de um pescador chamado Santiago, que depois de 84 dias sem apanhar um só peixe, acaba fisgando um de tamanho descomunal, que lhe oferece inusitada resistência e contra cuja força tem de se opor a de seus braços, do seu corpo, e, mais do que tudo do seu espírito. Mas onde a historia de Santiago um pobre pescador se cruza com a história do homem mais conhecido da face da terra: Jesus, o filho de Deus. É nesse ponto que focaremos uma intertextualidade.
Santiago: A origem do nome é espanhola e está relacionado ao Santo Católico. Um homem só, no mar alto, com seus sonhos e pensamentos, suas fundas tristezas e ingênuas alegrias, amando com certa ternura o peixe com que trava ingente luta até levá-lo a uma derrota leal e honesta. Na obra de Hemingway há uma rica interpretação dos elementos simbólicos que a contextualiza:
O mar: Pode ser considerado a propria vida. Há momentos que ele se encontra calmo e outros em que se mantém turbulento. Pode ser o lugar em que nos refugiamos, distanciando-nos da terra. O mar pode também ser o lugar a ser conquistado, o caminho a ser percorrido em busca do triunfo. E para isso o lugar temido deve ser vencido.
Não é de se espantar que, quando Jesus foi batizado, jejuou 40 dias e 40 noites antes de ser tentado. Depois de tentado pelo adversário, Jesus se dirigiu ao mar da Galilélia, onde lá, encontrou seus primeiros discípulos: Pedro e André.
Santiago ficou com seu amigo Manolin, (um menino) pescando durante 40 dias. Depois mais 44 dias pescando sozinho.
O Peixe: O peixe na obra pode ser traduzido como o “mundo”, que temos que enfrentarmos; a “humanidade”, a superação. Para Santiago o peixe era sua vitória, o seu triunfo, aquilo que realmente merecia a sua real dedicação, sofrimento, dor, sangue e até a sua vida.
Jesus de certa forma enfrentou um grande peixe: “a humanidade”. Para Jesus a humanidade merecia seu amor, sua dedicação, e, com isso enfrentou todas as dores, sofreu, deu seu sangue e sua vida pelos homens. A humanidade era o seu maior desafio. Teve suas mãos pregadas, semelhantemente Santiago, sofreu com cortes feitos pela linha com o suporte da força do grande peixe. Jesus carregou sua cruz até o final, Santiago carregou o que sobrou do peixe até a praia, e com isso teve seu reconhecimento de pescador. Jesus crucificado teve reconhecimento que verdadeiramente era filho de Deus. E o ápice dessa comparação está nas palavras de Santiago quando os tubarões deceparam o seu peixe:
Ay”,′ He said aloud. There is no translation for this word and perhaps it is just a noise such as a man might make, involuntarily, feeling the nail go through his hands and into the wood.
“Ay”. Ele disse em voz alta. Não há tradução para esta palavra e talvez seja apenas um ruído, como um homem pode fazer, involuntariamente, sentindo os pregos  passarem por suas mãos e pela  madeira.
Santiago foi literalmente crucificado no mar. E no final  da obra, Santiago divide o resto que sobrou do peixe. Manolin fica com a espada, e Pedrico fica com a cabeça. Manolin representa os jovens que deverão lutar pela nova religião Pedrico é uma evocação a Pedro, que ficou como o cabeça da igreja.
Os ensinamentos de Jesus e a obra O velho e o mar , são dotadas de profunda mensagem de fé no homem e em sua capacidade de superar as limitações a que a vida (o mar) o submente.