Páginas

Total de visualizações de página

sexta-feira, 13 de abril de 2012

Amargura, solidão e o desespero nas palavras de Emil Cioran e nas cores de Edvard Munch

O objetivo deste ensaio é aproximar a obra do Filósofo romeno Emil Cioran, com as pinturas do artista Edvard Munch (ícone do expressionismo).
Para a tal artimanha, realizaremos uma leitura dos quadros de Munch sobre a visão e os pensamentos angustiantes de Cioran. Não deteremos em fazer uma análise dos quadros e nem dos textos. Nosso exercício constituirá em transcrever as pinturas sobre o prisma das palavras. Na verdade uma metodologia difícil e muito provocadora, porém como afirma Cioran
"Não sei o que responder, o máximo que posso fazer é surpreendê-lo ou decepcioná-lo".

Antes de mergulharmos neste esboço, cabe a todos nós um pouco da vida de cada artista.

Evard Munch (1863-1944), pintor norueguês, nasceu na cidade de Löyten, no ano de 1863. Foi um dos poucos pintores escandinavos a ter sucesso mundial.
Teve uma infância traumática, que pode ser notada em grande parte de sua obra. Sempre um mergulho numa profunda reflexão sobre a condição e o destino humano. Munch aprofundou-se na sordidez, no mundo dos degenerados, dos loucos, da miséria; viveu uma época trágica. Assistiu à ascensão e as primeiras vitórias do nazismo e foi perseguido preso e espancado. Denunciou, em seus quadros, o totalitarismo e a guerra.  É considerado uns dos pioneiros do movimento “Expressionismo”.
Em 1908 sofreu um colapso mental, ocasionado pelo álcool, pelo excesso de trabalho e por um frustrado caso amoroso com uma mulher casada. Foi internado numa clínica de Copenhague. Saiu meses depois e voltou para Noruega onde morou até falecer.

Destacou-se como um dos mais importantes artistas europeus, Munch só obteve reconhecimento ao fim de sua vida e depois de sua morte. O expressionismo moderno desenvolveu-se, como escola definida, a partir dele e de Van Gogh.



Emil Cioran (1911-1995), escritor e filósofo romeno radicado na França, exaurindo seu interesse pela filosofia conservadora, já na juventude, Cioran criticava o pensamento sistemático e a especulação abstrata, defendendo as reflexões pessoais e o lirismo apaixonado.
Suas obras retratavam frequentemente uma atmosfera de tormento e tortura, situações que Cioran viveu e que vieram a ser dominadas pelo lirismo, sempre propenso a expressar sentimentos violentos.
Atraído pelo que ele mesmo chama de "naufrágio", pelo brilho do nada de tudo o que vive, Cioran interroga a vida, em todas as suas formas, e questiona os sentidos que a ela são atribuídos. 
Cioran permanece em nós principalmente pela sua postura  provocadora. Uma postura de quem não aceita adaptar-se ao mundo, e como ele mesmo nos diz:
"Não queremos mais suportar o peso das verdades, 
continuar sendo suas vítimas ou seus cúmplices. 
Sonho com um mundo em que se morreria por uma vírgula"


Para  procedimento em nossa empreita, além de algumas pinturas de Munch, trabalharemos com o livro "Silogismo da Amargura" de  Cioran.

, Melancolia, 1894-1896

 “Muito antes da física e da psicologia nascerem, a dor desintegrava a matéria e a angústia, a alma”


“Não encontrei no edifício do pensamento nenhuma categoria sobre a qual descansar a minha cabeça. Em compensação, que travesseiro o caos”



“Sofremos: o mundo exterior começa a existir...; sofremos demasiado: ele desaparece. A dor só o suscita para desmascarar sua irrealidade”



“Entediar-se é mascar tempo”



“A tristeza: um apetite que nenhuma desgraça satisfaz”



“Nada Mata minha sede de dúvidas: se tivesse o bastão de Moisés para fazê-las brotar até da rocha!”



“O tédio é uma angústia larvar; a melancolia, um ódio sonhador”


Separação 1900



“Só se entregam ao tédio as naturezas eróticas, decepcionadas de antemão pelo amor”

“Um amor que acaba é uma experiência filosófica tão rica que faz de um cabeleireiro um êmulo de Sócrates”

“Sonho ás vezes com um amor longínquo e vaporoso como a esquizofrenia de um perfume”

“Mescla de anatomia e de êxtase, apoteose do insolúvel, alimento ideal para a bulimina decepção, o Amor nos conduz a ralés de glória...”


Gólgota-1900

“Sem a vigilância da ironia, como seria fácil fundar uma religião! Bastaria deixar os curiosos agruparem-se em torno de nossos transes loquazes”

“O segredo de um ser coincide com os sofrimentos que espera”

“No Antigo Testamento sabia-se intimidar o Céu, se o ameaçava com o punho: a oração era uma disputa entre a criatura e seu criador. Para reconciliá-los chegou o Evangelho: esse foi o erro imperdoável do cristianismo”

“Mais ainda que a religião, o cinismo comete o erro de atribuir demasiada importância ao homem”



O grito- 1893

"Sou como uma marionete quebrada cujos olhos tivessem caído para dentro"

"Que tristeza ver grandes nações mendigarem um suplemento de futuro"

"Escutem os alemães e os espanhóis explicar-se: farão ressoar em seus ouvidos sempre a mesma cantilena: trágico, trágico... É sua maneira de fazer-nos compreender suas calamidades ou suas estagnações, sua forma de triunfar,,,"

Os tiranos, uma vez saciada a sua ferocidade, tornam-se inofensivos;tudo voltaria ao normal se os escravos, ciumentos, não pretendessem também saciar a sua. A aspiração do cordeiro a converter-se em lobo suscita a maioria dos acontecimentos. Quem não tem presas, sonha com elas; deseja devorar por sua vez e o consegue pela brutalidade do número.
A história, esse dinamismo das vítimas"

Todas as calamidades- revoluções, guerras, perseguições- provém de um equívoco inscrito sobre uma bandeira"

"Quanta concentração, quanto esforço e tato são necessários para destruir nossa razão de ser!"

Ao final de nosso trabalho não há outro sentimento se não, a amargura coagulando em nosso estado de reflexão à realidade. Realidade que não é apenas de Emil Cioran e de Edvard Munch; é a nossa realidade que semelhantemente a pintura "O Grito" nos olha perplexo. Pois somos sua imagem e semelhança. Seres multifacetados com a realidade, somos feridos por nossas próprias mãos. Somos feridos por um machado que deixa apenas uma cicatriz interminável em nosso ser. Cicatriz que o tempo como afirma Cioran:

"O Tempo está proibido para mim. Não podendo seguir sua cadência, agarro-me a ele ou o contemplo, mas nunca estou dentro dele: não é meu elemento. E em vão espero um pouco de tempo dos outros"

Então caros amigos e leitores; por não nos encontrarmos no tempo; na nossa realidade e muito menos em nosso próprio eu, tornamos indivíduos rejeitados por nós mesmos. 
Isso é bom? É mau? É angustiante?
Entretanto fica um pequeno (mas grandioso) silogismo de Cioran:
"Só os indivíduos rachados possuem aberturas para o além"
Emil Cioran



4 comentários:

  1. Muito interessante seu trabalho. Só conhecia o pintor, mas a ironia atravessa mesmo os dizeres do escritor.

    Abraço

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Cioran é realmente um provocador-mor...
      Sua visão negativa da vida nos convida a reflexão, pois como ele mesmo sugere:
      "Só as grandes dores, as dores inesquecíveis, desligam do mundo; as outras, as medíocres, moralmente as piores, escravizam porque tocam a escória da alma".
      Fico grato pelo comentário, mas Cioran não é apenas um filósofo amargurado, ele acreditava também na "utopia" pois:
      "Quando conhecemos o equilíbrio, não nos apaixonamos por nada, não nos apegamos nem à vida, porque somos a vida".
      Não deixe de conhecer esse grande autor!
      Danilo Pereira

      Excluir
  2. Danilo,
    Obrigada pela leitura do Emil Cioran, confesso que não tinha lido nada do autor.
    Agradeço pela sua disponibilidade em nos apresentar.
    Gostei mto.

    Abraços

    ResponderExcluir
  3. Também não conhecia o Cioran. Gostei do que li aqui.

    ResponderExcluir